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.Pois não temos sobre eles um impérioabsoluto (imperium absolutum), como já demonstrei.29Assim, embora seja mantida a recusa do império absoluto, é agoraafirmado que há um império da mente sobre os afetos, e a moderatio é a expressãodesse imperium não absoluto.No entanto, logo depois dessa afirmação, inicia-se acrítica aos estóicos e a Descartes por considerarem que a vontade tem absolutumimperium sobre as paixões e que a determinação da vontade depende apenas einteiramente de nossa potestas.Dessa maneira, duas distinções entre o usotradicional e o uso espinosano de imperium já podem ser percebidas: em primeirolugar, o imperium não é da vontade e sim da razão; e, em segundo, o imperium não éabsoluto, mas está determinado como um grau e uma qualidade da potentia mentisno governo dos afetos.Em outras palavras, visto que a potência da mente sedefine apenas pela inteligência e que a potência do efeito se explica pela potênciade sua causa, será da necessidade da potência da mente que o imperium serádeduzido, e não da liberdade da vontade.Mas, que significa falar em grau e qualidade do imperium? Ou que oimperium é um grau e uma qualidade da potência da mente? Se nos lembrarmos deque a Parte IV tem em seu centro a dedução das forças dos afetos, que essasforças são graus de intensidade dos afetos originários e de seus derivados, que ocampo da paixão é definido a partir da relação entre a força de cada partehumana da Natureza e a força das causas externas, e, enfim, que o embate alitravado se dá, de um lado, entre forças contrárias e, de outro, entre a força da29Ethica, V, Praef., Gebhardt, T.II, p.277.Cad.Hist.Fil.Ci., Campinas, Série 3, v.12, n.1-2, p.9-43, jan.-dez.2002.39Imperium ou Moderatio ?razão e a da imaginação, então não há enigma em que o imperium venhadeterminado como grau e qualidade da força da potência da mente e que ele seexprima e se realize exatamente como moderatio, isto é, como imposição demedida às forças afetivas e como arbitragem racional de seus conflitos, pois sãoesses os dois sentidos fundamentais de moderare.Aliás, é sugestivo, aqui,lembrarmos uma passagem do capítulo IV do Teológico-Político quando, ao sereferir à lei como mandato que os homens prescrevem a si mesmos e a outros,Espinosa fala em mandatum sobre a potentia; ao se referir, porém, à extensão da lei,fala em imperare sobre a vis.Essa distinção significa que a lei é menor do que apotência (por isso pode deixar de ser cumprida), mas que seu poder (imperare) semede pela força (vis) da potência humana.Em suma, um mandatum pode ser ounão respeitado; mas um imperare só pode ser respeitado porque nada exige acimada força humana.Sob esse aspecto, podemos compreender que, na Ética,Espinosa não só fale em graus do imperium, mas também em império absoluto darazão sobre as forças dos afetos e em império absoluto da mente sobre as ações.No entanto, algo mais está dito tacitamente quando Espinosa fala em graue qualidade do império da razão, pois está implícita aí a recusa da metafísica dopossível que sustenta o imaginário do império da vontade.Se apanharmos oPrefácio da Parte V por esta perspectiva, notaremos que em seu todo éexatamente a crítica daquilo que, como observamos há pouco, Espinosa parecenão criticar em Descartes, isto é, que possamos escolher as paixões que queremoster e as que queremos rejeitar.Nos artigos 144 a 146 do Tratado das Paixões, Descartes retoma a distinçãoclássica entre o que está e o que não está em nosso poder, examinando os desejoscuja realização depende somente de nós, aqueles cuja realização depende tambémdos outros e aqueles cuja realização não depende nem de nós nem dos outros.Osdois primeiros são aqueles que dependem exclusivamente do livre arbítrio decada um; mas os últimos são os que o vulgar diz depender da fortuna e que osábio conhece que dependem da Providência ou necessidade fatal.Dessa ma-neira, a distinção cartesiana dos desejos segundo sua fonte de realização retoma adistinção clássica entre o necessário e o possível, afirmando que não temos qual-quer poder sobre o primeiro e que temos o império absoluto sobre o segundo.Cad.Hist.Fil.Ci., Campinas, Série 3, v.12, n.1-2, p.9-43, jan.-dez.2002.40Marilena Chaui(
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